sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Os melhores e piores anos...

   Eu andava sozinho, conforme a chuva crescia. Não havia pessoas àquela hora. Eu chorava, desesperado, enquanto tentava me consolar sobre aquilo. Como aquilo pudera acontecer justo à minha pessoa? Eu ainda estava tentando entender os fatos. A situação toda ainda ecoava em minha mente, como em uma gruta. Gotas d'água pingavam em meu subconsciente, me dizendo que aquilo não podia ser verdade. Mas, meu cérebro ainda tentava ser consolado. O que eu fizera pra acontecer algo tão ruim comigo?
   Eu fui ao primeiro dia de aula, como todos os anos, sorridente. As férias mexem comigo de tal maneira que eu fico desolado. Mas, as aulas, sim, me revitalizam. O espírito escolar me acalma. Apenas isso. Eu ainda desconheço os efeitos de férias prolongadas, embora não queira saber. Conhecimento é algo aterrador. O simples "saber" da origem de algo tão profundo quanto o universo pode desestabilizar até mesmo o mais paciente dos monges.
   Lá estava ela, sentada, conversando com suas amigas. Ela era linda; a mais linda da sala. Meu coração bateu de tal forma que eu ainda não conseguia me mover. Era algo rápido e lento ao mesmo tempo. Eu conhecia o aroma de todas as meninas da sala, mas o dela era diferente. Era doce e amargo, ao mesmo tempo, como chocolate. Eu não conhecia ninguém, tampouco tinha vontade de conhecer.
   Fui, então, perguntar àquela que parecia ser sua maior amiga, quem era ela. Era alguém novo. Alguém que eu não conhecia. Alguém que merecia minha atenção, semi-exclusivamente. Sua beleza era tão singular quanto seu aroma, que eu ainda não consigo tirar da cabeça. Aos poucos, fiz "amizade" com aquela amiga. Eu ficava perguntando, por pura curiosidade, sobre a "amiga". Ela respondia, como se não houvesse nada de errado. Creio que ela se divertia ao falar sobre alguém que lhe era muito querido.
   Simultaneamente, fiz amizade a um rapaz (que prefiro não nomear, por razões de ética). Ele se tornou aquele que eu mais amava no mundo. Alguém que se assemelhava ao meu jeito em tantos pontos quanto possíveis. Nossas personalidades apenas se divergiam em aspectos básicos, como os gostos. Diferenças sutis, que não influenciaram em nossa amizade. A pessoa que eu mais amei no mundo, depois da "garota". Ela, ainda, era a única.
   Meu coração se partiu, então.
   Meu amigo, aquele que eu mais amava no mundo, começava a se interessar pela menina. O que eu fiz para merecer tal coisa? Eu não demonstrei descontentamento. Muito pelo contrário! Apoiei tal relação como quem não quer nada. E chorei. Chorei muito, pra falar a verdade. Eu não aguentava vê-los juntos. Quando eu via seus beijos, eu chorava. Seus abraços, me deprimiam.
   E, assim, meus únicos afetos, em toda uma escola, se uniam contra mim, e se libertavam da minha presença. Quando nós três estávamos conversando, eles fingiam que eu não estava lá. Havia uma centelha de esperança que se acendia em mim quando eu falava com os dois, separadamente. Ele reclamava do modo como a individualidade dela atrapalhava o relacionamento. Em contra-partida, ela só sabia dizer que ele era pegajoso e não via outra pessoa no mundo além dela, a pondo em um pilar, como uma deusa ou uma santa. Ela gostava de se sentir humana, mas ele a canonizava.
   O relacionamento durou bastante. Alguns anos e tudo o mais. Enquanto isso, meu coração se enchia de tristeza e solidão. Aquilo que me é mais curioso é que: embora eles fossem meus únicos amigos em toda a escola, nenhum dos dois percebeu que eu chorava cada vez mais e me sentia mais e mais excluído. Meus sentimentos não mudaram. Eu ainda não consigo vê-la e não chorar. Por que ela o preferiu? O que ele tem que eu não tenho? As perguntas correm soltas em minha mente, ao ponto que fico com dores de cabeça, quando penso nelas.
   Quando eles terminaram, nossa amizade ruiu.
   Tomamos caminhos separados. Cada um foi para sua respectiva faculdade, longe. Cidades diferentes, estados diferentes. A única coisa em comum era o país, mas a distância entre as faculdades era tão grande que caberia uma infinidade de principados europeus. Minha experiência de faculdade está sendo tão depressiva quanto possível. Eu moro com pessoas tão desagradáveis que chego a pensar ser o único sensato ali.
   Onde vou achar uma garota como aquela? Arte e ciência. Uma jovem escritora com uma carreira em aberto na medicina. Como eu pude perdê-la. Primeiro para ele, depois para o mundo. O mundo tomou aquela que eu amei, e eu decidi reavê-la. Ninguém podia tomar o amor da minha vida. Eu havia decidido após ler diversos romances adolescentes que me encorajaram de tal maneira que tomei o primeiro voo que apareceu.
   Há vários anos, quem diria que eu seria tão ousado?
   A maioria das pessoas me conhece como uma pessoa cautelosa, que vive em segurança. Não faz nada fora da "zona de conforto". E com razão, na verdade. Odeio surpresas. Me fazem parecer fora de controle da situação. E quem não odeia?
   Imagine que você foi informado que vai ganhar um presente. Você não sabe qual é o presente. Você sabe quais são suas necessidades. A pessoa que vai dar o presente, não sabe. Imagine que você quer ganhar um livro novo, de suspense. Ficou feliz, não? Agora, se imagine ganhando um casaco. Você já tem três casacos, dados pela mesma pessoa, mas ela lhe dá mais um. O que você faz? A) Mata a pessoa ou B) reclama, chora e, depois, mata a pessoa? De todo jeito, há vontade de matar a pessoa. Você não só não precisa de outro casaco como também não ganhou aquilo que queria. Realmente, não faz muito sentido ganhar presentes, pois são só desculpas dos outros para lhe dar coisas que você não precisa por motivos que você bem não entende.
   Sinto que entrei em um devaneio. Quando eu cheguei àquela faculdade, fui procurar a menina. Eu desejei, de todo o meu coração, que ela não tivesse esquecido de mim. Procurei, antes de mais nada, pela lista telefônica. Quando isso não adiantou, procurei pelas informações da matrícula, mesmo. Eu a encontrei só de calcinha e sutiã, atendendo a porta, sonolenta. Ela esfregava os olhos, como quem tira remela. Sua pele continuava pálida, embora seus cabelos estivessem mais claros, pela exposição ao sol. Seus lindos olhos negros se escondiam nas pálpebras caídas.
   Ela me perguntou o que eu estava fazendo lá. Eu respondi e ela ficou surpresa. Quando terminei de falar a situação, um homem mais alto que eu perguntou as palavras exatas "quem é, amor?". Surpreendi-me com a reação dela e mais ainda com a existência daquele homem. Ela nunca mencionou nada. Então, era verdade. Naquele ponto, realmente, nossa amizade estava fragmentada. Ela não lembrava mais de mim e eu não possuía qualquer obrigação de fazê-lo. Saí de lá sem dizer uma só palavra.
   Caminhando e chorando, pensei no que poderia fazer. A morte continuava sendo meu maior consolo. A vida na escola foi a melhor de todos os tempos. Mas, ela acabou. Nada mais valeria a pena. Não havia mais razão de viver. O que eu poderia fazer senão perecer? Sinto que as rimas suavizam o que fiz comigo mesmo. Se você estiver lendo isso, quer dizer que é inteira e completamente responsável pela minha morte. Meus apelos eram altos, embora ninguém quisesse escutá-los. Mas, eu ainda os amo. E sempre os amarei, em qualquer lugar onde esteja, pois a vida é momentânea. E aqueles momentos, foram os melhores da minha vida.

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